sexta-feira, 10 de abril de 2009

A Natureza Faz A Sua Parte (2)


... Então ele seguiu a sua intuição e ficou ali parado durante algum tempo, até tomar coragem de se sentar no mesmo banco, pra ficar um pouco mais perto daquela criatura misteriosa que estava fazendo ele perder seu horário, pois apesar de ele odiar a rotina do seu trabalho, ele cumpria com as suas tarefas exemplarmente, pois ele nunca gostou de ser cobrado, nem por nada e nem por ninguém.


E ela ali, parada, impassível, parecia que ela só procurava um lugar pra se abrigar da chuva e chorar, colocar pra fora todas aquelas lágrimas que com certeza não eram de felicidade.
De repente, ela começou a chorar mais forte e a soluçar, como se fosse uma criança que acabara de apanhar da mãe, e deu uma vontade enorme e surpreendente de querer abraçá-la, poder confortá-la, surpreendente sim, pois até ele mesmo se espantou com aquilo, uma pessoa que mal se importa com si mesma, querendo demonstrar afeto por outra pessoa, ainda mais uma desconhecida.

Ele ficou tentando decifrar a dor dela, milhões de coisas passaram pela cabeça dele, briga com o namorado, assalto, se ela tinha perdido o emprego, mas ele não tinha como saber isso, ele nem sequer tinha visto o rosto daquela mulher.
Mais uma vez ele se pegou hipnotizado por aquele perfume, que agora estava mais forte, juntando com o cheiro da terra molhada, fazendo ele sentir um turbilhão de sensações, parecia que ele podia tocar, sentir o gosto daquela mulher somente pelo seu cheiro.


Ele começa a olhar pra frente, os carros passando com cuidado naquela chuva forte, não havia uma pessoa sequer que se arriscasse a andar a pé naquele temporal, estavam só ele e ela ali, parados, um ao lado do outro.
E ele ficou se perguntando:
"Será que ela me viu aqui?"
Impossível não ter notado a presença dele ali, ele tem uma mania de mascar chicletes de canela o dia inteiro, sem contar no barulho que o zíper da mochila fez, e o fato de ele ter sentado no mesmo banco.
Então ele pensou o que realmente tinha acontecido, ela simplesmente tinha ignorado a sua presença ali, e isso deixava ele cada vez com menos coragem de fazer alguma coisa.

Agora ele começa a reparar no que aquela mulher estava vestindo, ela tinha uma saia bem longa, toda preta, e uma bota daquelas de couro com um salto bem alto.
Ele estava se concentrando naquele cabelo ruivo, molhado pela chuva e com uma beleza natural que ele jamais tinha visto, parecia que nada podia macular a beleza daquela mulher estranha, então ele fingiu tentar ler um cartaz que estava colado no vidro do ponto, somente para se inclinar e chegar mais perto do cabelo dela.

A vontade que ele sentiu na hora era de tomar aquela mulher nos braços, e beijá-la apaixonadamente, segurando ela pelos cabelos, e apertando o corpo dela contra o dele, mas ele se conformou em apenas passar o dedo indicador de leve, no cabelo dela que estava nas suas costas.
Depois que ele fez isso ele se sentiu um pouco mais confiante, afinal de contas, ela era de verdade, não era uma imaginação da sua mente fértil, ela a tinha tocado, sentido seu perfume...

Relâmpagos começam a aparecer por entre as nuvens, e ele pensou que não demoraria pros trovões chegarem ensurdecedores.
E ele estava certo, quando ele estava olhando pro céu, viu um raio ao longe, daqueles que rasgam os céus como se fosse o dia do julgamento final.
Logo depois, aquele estrondo enorme, que ele levou um susto e por instinto olhou pro lado e fechou os olhos fazendo uma careta, eis que quando ele abre os olhos, ela estava ali, do lado dele, alerta, não tinha mais a cabeça baixa, estava ereta como se fosse numa aula de postura.
E finalmente, ela olha pro lado dele, e pela primeira vez eles trocam olhares, e ficam se fitando, sem dizerem palavra...

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