terça-feira, 14 de abril de 2009

Saindo Do Hospital (6)

Agora ali deitado, ele teria muito tempo de pensar nessa sua vida que ele não lembrava direito.
Ficou puxando do fundo da sua mente todas as informações que fossem possíveis, se esforçou tanto que lhe deu dor de cabeça, mas uma dor a mais não iria fazer diferença.
Até que conseguiu se lembrar um pouco mais das coisas, e agora as lembranças de sua infância eram as únicas coisas das quais ele conseguia se lembrar nitidamente.
Lembrou da época em que brincava na rua com os amigos, não era isso o que ele mais fazia na infância, pois ele tinha um fascínio enorme pelos jogos eletrônicos, mas como a sua condição financeira não favorecia, ele tinha que se virar com o que tinha, e foi desde essa época que ele aprendeu a se transformar e se adequar às adversidades da vida.

Agora ali do lado de sua cama tinha uma criança conversando com a mãe, e fazendo milhares de perguntas sem nexo, mas como uma criança pode ser coerente?
Crianças são apenas crianças, e são puras de alma, verdadeiras ao extremo e sempre sinceras.
As crianças não sabem mentir, se fazem uma besteira em casa, logo se acusam, mesmo sem saber que o estão fazendo.
Ele riu sozinho com esses pensamentos que teve, e ficou pensando mais sobre esse assunto de sinceridade.
Ao contrário das crianças, nós os adultos, aprendemos a contar nossas mentiras tão bem, que se não fossem fictícias, teriam realmente acontecido.
Se tivéssemos mantido esse coração puro e essa ingenuidade das crianças, não sofreríamos tanto, já que na concepção dele, a verdade era dolorosa, mas as mentiras são muito piores.

Pensando nisso, ele se lembrou de mais uma coisa:
Depois de vários anos de vida com sua família, ele descobrira sozinho que tinha sido adotado, tinha por volta de seus 18 anos, com todas as incertezas da vida, sem saber o que ele realmente queria seguir como carreira, o alistamento no exército que ele achava uma tremenda palhaçada, os conflitos internos por ser muito introvertido, os poucos amigos que tinha, e o seu grande problema de timidez que o deixava furioso, ele descobre que é adotado no meio desse furacão todo.

Ele não ficou com raiva de sua família, afinal de contas eles o criaram da melhor forma possível, e se tinha uma coisa que ele sabia reconhecer na vida, era o sacrifício dos outros.
Só ficou chateado de não saber de suas origens, de saber que o sangue que corria nas suas veias não eram de seu pai e de sua mãe de adoção, mas na alma ele sentia que pertencia aos dois.
Acordou dos pensamentos com a criança puxando o pé dele, quando ele olhou pra ela, ela saiu correndo como se ele fosse um bicho-papão e dando gargalhadas.
A mãe da criança se desculpou e ele disse que não tinha problema nenhum.
Ele até que gostava de crianças, mas se convivesse com alguma durante muito tempo se estressava muito fácil.

Ele nunca entendeu muito essa sua implicância com as crianças, deveria ser algum trauma de quando ele era pequeno, e de como ele lembrava como se fosse hoje, a maldade que as crianças faziam com as outras quando não estão sendo observadas.
Sempre tinha um grupinho em alguma festa que ele ia, que se juntava e como ele não era amigo deles, sempre faziam maldades, ficavam o empurrando, tirando sarro, e etc.
Sua mãe nunca entendia o motivo de ele ficar sempre sentado no seu colo nas festas de crianças, e ele era orgulhoso demais já naquela época, a ponto de pedir ajuda a quem quer que fosse, então fugia assim dos problemas.

Mais uma vez sentiu alguém mexendo no seu pé, mas dessa vez não era a criança, era um homem da mesma idade que ele, ele veio ao encontro dele e disse:
"Você é maluco seu filho de uma puta? A gente tá te procurando a uma semana já seu merda!"
Ele não sabia quem era, mas pra falar com ele desse jeito, devia ser seu amigo...

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